
Há pouco tempo, a inteligência artificial (IA) era saudada como a solução definitiva para o aumento da produtividade no mercado. Hoje, ela também se tornou a desculpa ideal para a preguiça e a ausência de pensamento estratégico. A ascensão dos prompts prontos transformou uma parte significativa dos profissionais de marketing em meros operadores de ferramenta, desviando-os do papel essencial de pensadores e estrategistas de marca.
As redes sociais estão cheias de “gurus” que confundem automação de processos com a criação de uma estratégia de valor. Da mesma forma, algumas agências entregam um alto volume de conteúdo no lugar de um trabalho que realmente gere valor e impacto. O problema, contudo, não reside na IA em si, mas na maneira como ela está sendo utilizada pelos profissionais.
A IA revela a ausência de estratégia
As máquinas não estão roubando empregos; elas estão, na verdade, expondo aqueles que nunca compreenderam a fundo o seu trabalho. O redator que se limita a depender de um modelo de linguagem para produzir um texto sempre foi mais um datilógrafo do que um estrategista de conteúdo. O designer que pede à IA “faça uma arte bonita” sem o conceito estético por trás nunca foi um artista, apenas um executor de tarefas.
Essa realidade ecoa a provocação de Peter Drucker: “a maior ameaça em tempos de turbulência não é a turbulência em si, mas agir com a lógica de ontem”. Muitos profissionais estão aplicando lógicas antigas a ferramentas novas, na crença errônea de que a tecnologia preencherá a ausência de pensamento.
O poder da pergunta na nova elite criativa
Estamos presenciando o nascimento de uma nova elite no pensamento criativo: o profissional que sabe perguntar. A inteligência artificial não oferece respostas relevantes por acaso; ela responde diretamente à qualidade do comando, ou seja, à qualidade da pergunta feita.
Guy Kawasaki, um influente evangelista do pensamento criativo no Vale do Silício, afirma que “as perguntas certas valem mais do que as respostas perfeitas”. No marketing contemporâneo, essa máxima se tornou o diferencial competitivo. O verdadeiro valor de um profissional, hoje, reside na capacidade de extrair insights valiosos da máquina, e não no mero ato de copiar o que ela gera.
O risco da homogeneização do mercado
A busca pela eficiência rápida, disfarçada de repetição, transformou o mercado em um vasto cenário de “copiar e colar” prompts. O resultado é a homogeneização: campanhas que se parecem, marcas que perdem a identidade e um discurso que se torna indistinto. O marketing, que por natureza deve ser o palco da emoção humana, corre o sério risco de perder a sua essência para a conveniência de simplesmente “gerar conteúdo”.
Seth Godin já alertava que “o marketing é uma arte generosa, é sobre causar impacto nas pessoas, não apenas empurrar mensagens.” O que se vê hoje, porém, é o oposto: a pressa em produzir substituiu o propósito genuíno de comunicar. Philip Kotler, conhecido como o pai do marketing moderno, define o papel do profissional como a tradução de “necessidades humanas em ofertas relevantes”.
Mas como é possível entender o fator humano se a única prática é repetir mecanicamente o que a máquina entrega?
Pensamento humano versus automação
Quem se limita a usar o prompt criado por outro profissional já começa a operar com o cérebro de quem abdicou do próprio pensamento. Enquanto alguns apenas automatizam ideias, os verdadeiros estrategistas estão ativamente reprogramando o mercado com ousadia, senso crítico e, ironicamente, com um toque maior de humanidade.
A criatividade nunca foi uma questão de velocidade, mas sim de sensibilidade. A IA acelera o processo e a execução, mas ela não é capaz de substituir o repertório pessoal, a capacidade de escuta atenta, a empatia e o olhar que consegue enxergar o invisível — tudo aquilo que um algoritmo ainda não consegue interpretar.
Como dizia Steve Jobs, a inovação “não é sobre tecnologia, é sobre humanidade”. E é exatamente este ponto que faz a distinção entre o criador e o digitador, o estrategista e o operador, o profissional relevante e o substituível. O futuro do marketing pertence não a quem simplesmente domina a tecnologia, mas a quem domina o sentido e o propósito.
A IA é apenas um espelho: ela reflete o tamanho e a qualidade do nosso próprio pensamento. É preciso cuidado para não apertar o botão “enter” achando que se está inovando, quando na verdade se está apenas automatizando a falta de ideia.
